Saturday, June 18, 2011

A sustentável leveza do ser

Naquele dia, quando entrou no carro dele, ela estava feliz. Ele a abraçou longamente e, a partir deste instante, ela não parou mais de se sentir como, em suma, todas as pessoas deveriam se sentir: leve. Entrou neste estado e lá permaneceu. Ele a olhava com curiosidade. Tudo nela parecia fluir. Ela o olhava com ternura. Pressentia no jeito dele o distanciamento de quem precisa planejar as palavras com cuidado. Conhecia isso, o esconderijo dos que se sentem vulneráveis e não podem ser descobertos. Ela via, mas não refletia sobre e nem julgava. Não queria. Este lugar lhe era familiar e ter ciência disso bastava. Talvez até fosse sensato tentar entender o motivo específico pelo qual ele sempre buscava a palavra certa. Talvez. Mas ela não conseguia ou nem precisava. Depois daquele abraço, esta defesa tornara-se desnecessária, já que ela passou a ter a tranqüilidade das pessoas destituídas de finalidade que aceitam ser usadas. Usada pra quê, ela não sabia exatamente, mas não importava. Ele, por sua vez, reforçava as suas artimanhas para impressioná-la; traçava estratégias mirabolantes. Ela escorria. Estava derretida por ele, não por sua astúcia, ou lábia ou elogios. Simplesmente pela alquimia. Ele, concentrado, prosseguia se esforçando para que ela o achasse incrível, sem saber que ela já achava isso desde o primeiro instante em que se conheceram, semanas antes, quando ele, conscientemente, foi em sua direção, sentou ao lado dela e eles se olharam. Foi assim para ela, mas, naquele momento, ele não atinava. Estava ocupado demais com o seu objetivo e, por isso, continuava fazendo de tudo para que ela gostasse dele. Empolgada, a noite passava. Só não passava a leveza que existia dentro dela. E o observador que existia dentro dele. De mãos dadas, os dois ligados seguiam. Ele a estudava. Ela Sorria. Ele procurava decifrar. Ela sentia. Por mais que ele a investigasse, ela só sentia. Por mais que ele a analisasse, ela, exonerada do pensar, só existia. Porque naquele dia, quando ela entrou no carro dele, algo inusitado aconteceu.  Sabe uma daquelas coisas que ocorrem uma vez em um milhão? Exatamente esta. Inesperadamente, naquele longo abraço, ela compreendeu o que nunca antes havia captado: a quadratura do círculo. E, por esta razão, mesmo que ele insistisse em seu quadrado papel de observador, ela, leve e maravilhada, circulava.

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