Eu até queria lhe contar os detalhes da minha morte, mas acho que não tem muito mais a ser dito. Foi relativamente simples. Quando cheguei lá no
portão, ele me disse: “depois de passar pelos portais, você se suicidou”.
Fiquei atônita. Ele continuou: “como você demorou!”. Já que eu não me manifestei, repetiu:
“demorou”. Mesmo morta, fiquei indignada. Até aqui estão me julgando.
Inacreditável. Mas ele me abraçou e me acolheu. Quem é ele? Um dos guardiões
daquela dimensão. Acho. Apontou para o gondoleiro. Vi que era você. Não concatenei.
Como assim? Você estava lá no mundo inferior comigo? Que loucura! Você entrou
na mais escura das noites só para me resgatar. Que coragem! Disseram que não
teria saído sem a sua ajuda, teria vagado indefinidamente. Porém confesso que não fiquei feliz em lhe ver. Nem
triste. Estava perplexa. Você tinha um barco e cantava. Que situação inusitada.
No outro dia, pedi para que providenciassem uma mortalha. Branca, se possível. Lembrei
de Antígona e me enrolei no pano. Tinha essa urgência de ser sepultada. No
terceiro dia, a minha alma voava livre. Em meu corpo, corria um rio. O que vai
acontecer com você? Não sei. Nada foi dito. Pelo que entendi, você vai passar
um tempo aí. Aí onde? No profundo e escuro inconsciente. No espaço enigmático onde só a lua ousa entrar.
Monday, May 14, 2012
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2 comments:
Muito lindo!!! Consegui ver com total clareza essa cena. Não sei, mas acho que muita gente já teve sonho assim. Abraços
SIm! Faz parte do inconsciente coletivo :)
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